quinta-feira, 14 de abril de 2011

O terceiro olho



Era um happy hour, mas você só chegou agora, garota. Por que? Diz que estava acompanhando uma partida de futebol, teu time perdendo. Mentira. Estava mesmo era ensaiando seu sorriso com dentes pequenos antes de sair. Todos na mesa têm nos jeans e camisetas as marcas amassadas de um dia todo de trabalho enquanto você vem com cheiro de banho e vestido solto. Metida a mulherzinha. Não quer que te vejam no pub sem se arrumar. 

Você não sabe, guria, mas essa maquiagem não esconde sua carinha de Maricota-sem-dono. E seus ombros de fora expõem ainda mais a carência que você cansou de carregar. Senta aqui, pára de olhar o casalzinho que namora e não te vê. Esqueceu que tudo isso é brega?

Se é isso que me tem ao certo
A moça de sorriso aberto...

O amor é uma invenção publicitária. Material de slogan que um romântico Amélie Poulain criou enquanto fazia brainstorm. Virou tema pra vender batom, colchão, o perfume que você usa, absorvente, picolé. É lixo que você descartou ali na esquina. Não é isso que você diz? É, é sim. Mas por trás desses óculos seus olhos te contradizem e, meu bem, tem um letreiro piscando aí pedindo companhia, uma mão pra ajeitar essa franja que não pára de cair e me irrita, um telefonema pra te acordar de madrugada, um beijo no pescoço pra... 

E não torça esse narizinho pra mim. Sua rebeldia e frieza nunca foram nem de boutique. São de bazar, e olhe lá! No máximo me fazem rir. E eu sou um cara que adora seus chiliques. Sério! Me divirto com a careta quase previsível que sempre faz quando perguntam porque ainda está sozinha nessa altura da vida. "É que eu quero um relacionamento aberto, curto swing, sou masoquista, fiz um pornô no ano passado e os homens são puritanos demais pra aceitar", responde naquele momento em que a Coca-Cola não mata a sua sede e uma dose de álcool já te faz balançar.

Depois escora o rosto nas mãos, parece se pendurar nos cotovelos e cantarola sobre a menina-na-esquina-vestindo-um-casaco-preto e bla bla bla com um gato envolvido. Derruba as respostas duras, marrentas, volta a ser meiga. Quase infantil. Sai rindo de tudo, alisando a mesma mecha de cabelo. Depois olha pra mim e diz que vai "fumar quando crescer", só pra copiar minha pose de "estátua grega na sauna". Quê? Aí me vingo. Digo que não vai. Até porque não vai crescer. Tem pernas curtas até hoje, mulher. Tão curtas quanto o "nem ligo" que sempre solta quando algo dá errado ou o "tá tudo bem" que quase tatuou na testa dias atrás só pra repelir qualquer pergunta do tipo "o que você tem?". Vontade de fazer não-sei-o-quê, eu acho. 

Agora sei, não mais reclama,
Pois dores são incapazes...
(Maria Gadú)

Faz bico de novo. Odeia que eu te analise. "Humpf! Tira esse sorriso de macho alfa do rosto. Que ridículo". E sai pisando duro, meio rebolativa, até chegar ao portão e abri-lo. Vai tomar um banho gelado, deitar com o cabelo pingando e cheirando shampoo de pêssego. Vai cair na cama sozinha, se enroscar nos milhões de  travesseiros que usa pra dormir e esperar sua hora chegar. Eu sei. 

8 comentários:

Thalles Rezende disse...

Que revolta mulher!!! rs...

Carina Martins disse...

As vezes essa sou eu... rs

bjkitas
Carina

Mari disse...

Né revolta, não, Thalles! Hahaha... E quanto a vc, Carina, que bom que se identifica. Acho que todo mundo é um pouquinho assim... Beijo, gente. Obrigada por terem lido.

Lílian disse...

O primeiro que me fizer essa pergunta (mais uma vez!) mando esse texto como resposta!
Brigada Mari!

Andreza disse...

Gente, que gracinha de texto. Gostei. Acho que vc já tá conseguindo ficar longe... Antes lia e já te via neles, mas agora já tá começando a ficar difícil. Isso é mto bom. Parabéns, Vaca!

Naira disse...

adoreiiiiiiiii!!!!!!!!!!!

Mari disse...

Eu odeio, Lil... quando não dou uma resposta malcriada eu me seguro pra não estapear o ser humano que vem com essa... Deza, pois é... mistéééério... hahaha... Nairinha, publicitária favorita, a culpa toda é de gente como vc.

Anônimo disse...

Ameeiii...! ;o) Fabi!

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